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Professora da UFSB comenta a instituição do Dia Estadual de Enfrentamento à Violência contra a mulher

  • Publicado: Terça, 13 de Novembro de 2018, 17h47
  • Última atualização em Quarta, 14 de Novembro de 2018, 10h07
  • Acessos: 3490

No dia 31 de outubro, foi publicada, no Diário Oficial do Estado da Bahia, a Lei n° 14.020, que institui o 13 de novembro como Dia Estadual de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher no Estado da Bahia. Para comentar o significado dessa lei para as mulheres baianas, a Assessoria de Comunicação convidou a professora Célia Regina da Silva, do CJA e do Programa de Pós-Graduação em Ensino e Relações Étnico-Raciais.

A professora Célia tem reconhecida atuação acadêmica interdisciplinar, principalmente nos estudos sobre Mulheres e Mídia. É doutora em Comunicação Social pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social (PÓSCOM) da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), mestre em Ciências Sociais pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPCIS/UERJ) e bacharel em Comunicação Social pela Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ECO/ UFRJ).

 

ACS: No seu entendimento, qual o significado de uma lei como essa para as mulheres da Bahia?

Professora Célia: A instituição de uma data de enfrentamento à violência contra a mulher só reforça outras iniciativas vigentes no estado da Bahia, como a Ronda Maria da Penha, por exemplo. É um ganho importante para todas nós, mulheres. Na Bahia, Itabuna é o município, depois de Salvador, com maior número de registros de violência contra a mulher. E, aqui na Bahia, temos um diferencial: estamos em um estado com 80% da população negra, e a violência contra as mulheres negras só aumenta. O número de casos de feminicídio de mulheres negras tem aumentado, ao passo que, em relação às mulheres brancas, tem caído. No Brasil, temos uma história da violência contra as mulheres que está ligada, sobretudo, a uma vivência do patriarcalismo que é muito forte ainda na nossa sociedade.  Violência contra a mulher existe em vários países do mundo, só que, nas sociedades nas quais o patriarcado é mais forte, ela se apresenta de forma muito mais profunda, pois está arraigada nas estruturas sociais. Nós, dos países latino-americanos, por conta dos processos de colonização, fomos erigidos em cima de muito sangue, de muita violência. As mulheres indígenas que estavam aqui, como as africanas que foram trazidas, eram estupradas. Então, a gente só pode comemorar essas leis que possam atacar todo o processo histórico de violência contra a mulher. A cada 5 minutos uma mulher é agredida, e a cada 11, uma é estuprada. São números muitos altos. O combate requer ações culturais, e, sobretudo, educativas. Porque, se o processo não tiver previstas ações educativas, vai ficar só no papel.

 

ACS: Como você analisa a tipificação do que é violência contra a mulher, conforme o artigo 2° da nova lei estadual?

Professora Célia: O que achei interessante na tipificação proposta é ela considerar tanto o ambiente privado quanto o público. Se pensarmos que o racismo e o machismo estão entranhados nas nossas estruturas sociais e nas nossas instituições, penso que essa tipificação facilita as ações judiciais. Porque, para se identificar a violência no âmbito privado, parece mais fácil, por ser mais explícita. Ao abarcar também o espaço público, facilita, no sentido de que, muitas vezes, essas violências são minorizadas, pois não são tão fáceis de identificar. Elas são mais “sutis”, se é que a gente pode falar em sutileza em casos de violência...

ACS: Se consideramos o que prevê o artigo 3°, que tipos de atividades, ações, seriam mais eficazes, na sua opinião, no contexto do Sul e Extremo Sul da Bahia?

Professora Célia: Penso que atividades educativas. No último sábado, estive com estudantes de outra instituição, de Direito e de Psicologia, falando sobre violência contra a mulher. Na ocasião, estava presente também a Secretária de Políticas para as Mulheres, que veio de Salvador. Era um público misto, não eram só mulheres. Penso que essas são ações educativas e que têm que ser feitas em conjunto, como iniciativas de várias instituições. Entram aí universidades, OAB, grupos comunitários, grupos de defesa da violência contra as mulheres, enfim, tem que ser um comboio de atuação. As três instâncias do Estado devem se unir e também aos movimentos sociais, pois a temática da violência contra as mulheres tem que ser debatida, conversada desde sempre, desde os pequenininhos até os adultos, porque ainda é tudo muito arraigado. Ainda temos uma cultura de violência que está muito entranhada na sociedade. Como ensina Crenshaw, a advogada e professora de Direito afro-americana, ao abordar a noção de interseccionalidade, quando a gente pensa na interseção de gênero, raça e classe, percebemos que as mulheres negras e nordestinas estão em situação de muita vulnerabilidade, já que estão na base da pirâmide econômica. Só com ações de proteção e de respeito à mulher é que a violência poderá ser combatida. E as políticas afirmativas de enfrentamento da violência contra as mulheres, associadas ao uso de ferramentas educativas, só tendem a fortalecer esse trabalho.

ACS: Considerando que estamos no Novembro Negro, você acredita que as mulheres negras são contempladas por leis como essas ou seria necessário pensar em leis ou ações específicas?

Professora Célia: Decerto que a situação das mulheres negras não pode ser separada da interseção machismo, racismo e da questão de classe. As instâncias de poder, as instituições precisam ter consciência de que a violência de gênero é sofrida por mulheres negras e brancas, mas o racismo acentua o machismo, ou seja, no caso das mulheres negras, sabemos que estão muito mais expostas a situações de violência, inclusive nas instituições que deveriam protegê-las como escolas, hospitais, delegacias. Principalmente, numa região (Sul da Bahia) que tem um histórico de coronelismo, que é patriarcalismo, ainda muito arraigado. A desconstrução disso é necessária para todas(os) nós. Para mim, o mais importante é o estímulo para que as mulheres não se calem, denunciem. E nós, como membros da universidade, precisamos pensar ações. E pensar o próprio ambiente acadêmico, que também é de extrema violência, disfarçada, muitas vezes, de brincadeiras. E violência nunca é brincadeira. Para finalizar, enfatizo que a mulher deve falar, abrir a boca, gritar, denunciar!

 

Informe-se

A Diretoria de Políticas de Promoção da Diversidade da Pró-Reitoria de Sustentabilidade e Integração Social (PROSIS) preparou um folder que reúne contatos de instituições que atuam no combate aos atos de violência contra a mulher, bem como no apoio às vítimas nos municípios da área de abrangência da UFSB.

Confira e divulgue para as mulheres das suas redes de contato!

 

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