UFSB lança Projeto Consonâncias na Semana da Água
O Projeto Consonâncias é uma iniciativa da Coordenação de Integração Social da Pró-Reitoria de Integração Social e Sustentabilidade (Prosis) e pretende divulgar as atividades das representações de servidores/as docentes e técnico/a-administrativos/as da UFSB em órgãos colegiados gestores de políticas públicas das três esferas do poder público: federal, estadual e municipal, dentre outras participações de relevância acadêmica e social.
A primeira edição do Projeto Consonâncias envolve a Coordenação de Sustentabilidade da Prosis e destaca o Dia Mundial da Água, 22 de março. Para falar sobre o tema, convidamos os representantes da UFSB nos Comitês de Bacias Hidrográficas (CBH) da Bahia, professor Marcos Bernardes, do Campus Sosígenes Costa, que é presidente do CBH dos rios Frades, Buranhém e Santo Antônio (CBH FRABS), e o professor João Batista Lopes da Silva, do Campus Paulo Freire, membro do CBH Peruípe, Itanhém e Jucuruçu.
O professor Marcos Bernardes é decano do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências (IHAC) do Campus Sosígenes Costa, em Porto Seguro- BA, lotado no Centro de Formação em Ciências Ambientais (CFCAm). Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8907565424580663
O professor João Batista Lopes da Silva é decano pro tempore do Cento de Formação em Desenvolvimento Territorial do Campus Paulo Freire, em Teixeira de Freitas - BA. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/2107932993887541
Os docentes representantes da UFSB nos Comitês de Bacias Hidrográficas concederam entrevista à coordenadora de Sustentabilidade, Luana Campinho Rêgo.
Luana Rêgo: Qual a importância da UFSB ter representação nos Comitês de Bacias?
Marcos Bernardes: A Lei 9.433/1997 também é popularmente conhecida como a "Lei das Águas". Ela prevê que a gestão das águas no Brasil ocorra de modo compartilhado, com os diferentes segmentos da sociedade (governos, sociedade civil e usuários das águas) representados em um dos principais fóruns decisórios sobre os recursos hídricos no Brasil. Esses colegiados são os chamados Comitês de Bacias Hidrográficas. Além de garantir a representatividade dos diversos segmentos sociais, o arranjo institucional dos comitês de bacia assegura a diversidade geográfica de seus representantes. Afinal, a água é um bem de uso comum e o que acontece em um trecho de uma bacia hidrográfica pode comprometer o seu todo. Um exemplo disso é o que se viu com os desastres recentes com mineradoras no Brasil, de efeitos sociais, econômicos, ambientais, culturais negativos não apenas na região dos desastres, mas em toda a bacia hidrográfica e até mesmo nas zonas costeiras e marinhas.
Outro exemplo, ainda mais recente, foi observado no derramamento de óleo na costa brasileira, em que regiões estuarinas - as de encontro entre rios e mares - foram afetadas por um evento muito provavelmente ocorrido em alto mar. Pode-se observar, por esses exemplos, como há enormes conexões e interdependências entre o que ocorre nos continentes e nos oceanos, e vice-versa. Nós, que representamos as instituições de ensino e pesquisa nesses comitês de bacia - junto com colegas do IFBA, da UNEB e de outras instituições -, temos por objetivo promover a discussão e o aprimoramento da gestão das águas no Brasil, de modo a valorizar o conhecimento científico e promover o diálogo entre esses saberes e os ditos "tradicionais".
Trata-se, ainda, de valorizarmos ações acadêmicas, como a integração das demandas tratadas nesses fóruns com o tripé das instituições de educação superior: o ensino, a pesquisa e a extensão. Portanto, a participação da UFSB nesses fóruns deve se orientar por promover uma "via de mão dupla", com a troca de conhecimentos e saberes, com respeito à diversidade de demandas e de pontos de vista que caracterizam os comitês de bacia.
João Batista: Os comitês de bacias apresentam uma representação de cada setor de nossa sociedade civil, desta forma, a representação do setor de educação é de extrema importância para a interlocução e tramitação da universidade com a sociedade. Para a UFSB, ocupar esse espaço é importante para ter voz e opinião nas questões de gestão das águas de nosso território, como também para o desenvolvimento de projetos que auxiliem o comitê e suas câmaras técnicas na gestão das águas. É dever da UFSB, e de todas as universidades, o desenvolvimento de projetos junto aos comitês, pois é uma resposta a nossa sociedade sobre as melhorias que a educação e a pesquisa podem promover.
Luana Rêgo: Quais as pautas mais relevantes em discussão no Comitê de Bacias?
Marcos Bernardes: O foco principal de atuação dos comitês de bacia é garantir água em qualidade e quantidade adequadas. Como se observa cada vez o aumento de disputas pela água, sob a forma de conflitos pelo seu uso, os comitês de bacias devem funcionar como fóruns de mediação entre os diferentes interesses da sociedade. Pode-se imaginar que a água é um recurso finito e que, especialmente sob condições de estiagem ou mesmo de poluição/contaminação de um rio, que não haja água em qualidade e/ou em quantidade adequadas para atender todas as demandas. Na nossa região, que ainda é vista erroneamente como um local onde não há problemas de escassez ou de comprometimento da qualidade da água, cabe a esses colegiados propor, acompanhar e avaliar políticas de gestão das águas, como também instrumentos de planejamento, como os chamados planos de bacia, conjunto de ações para garantir água em quantidade e qualidade adequadas para toda a sociedade e em observância ao equilíbrio ambiental.
João Batista: As pautas em discussão, no momento, estão mais ligadas ao apoio ao Plano de Bacias, instrumento legal para a gestão e cobrança do uso das águas das bacias, pois somente desta forma podemos dar a devida valoração dos nossos recursos hídricos, como também assegurar esse recurso às futuras gerações.
Luana Rêgo: Como você avalia os trabalhos do Comitê de Bacias (regularidade das reuniões, atuação das câmaras temáticas, participação da sociedade civil, diálogo entre poder público e sociedade civil)?
Marcos Bernardes: Muito se avançou no Brasil desde a instituição da "Lei das Águas". Contudo, também há enormes desafios, como assimetrias no poder político-econômico de determinados segmentos em detrimento de outros, a falta dos Planos de Bacia, com previsão de o que, como e quando se pretende dar a devida atenção às nossas águas. Ainda estamos engatinhando também na observação de longo prazo do que ocorre com a qualidade e quantidade da água, uma vez que o monitoramento dessas variáveis ainda é precário. Muitas vezes, pela falta de dados de campo, não sabemos como aquela bacia hidrográfica se comportou no passado e se o futuro daquela região pode ser projetado a partir do que já se conhece.
O sucesso dos comitês de bacias também depende da parceria e atuação de outras instâncias e órgãos, como os de controle/fiscalização, além do aparato jurídico-institucional de proteção às águas. No CBH FRABS, assim como na maioria dos comitês de bacia na Bahia, são realizadas quatro sessões ordinárias por ano, que contam com presença expressiva dos seus membros. Dentre os principais desafios, destaca-se a necessidade da sociedade reconhecer o papel desses colegiados e, nesse sentido, precisamos aprimorar a nossa comunicação.
João Batista: Particularmente, acho que o comitê se envolve demais em disputas internas, o que prejudica o andamento das ações. Também vejo baixa adesão da sociedade civil e poder público, sendo que a sociedade pouco sabe sobre o comitê e suas atuações, como o poder público não faz o devido investimento para que as ações possam se concretizar. A contratação do Plano de Bacias é de competência do poder público, mas não a sua avaliação, que é do comitê. Sem o Plano, pouco pode se fazer.
Luana Rêgo: Como as discussões do Comitê de Bacias impactam ou podem impactar na vida da população do território?
Marcos Bernardes: É muito comum as pessoas só valorizarem algo quando esse bem/serviço está comprometido. Com as águas, não é diferente. O desafio é conseguir mobilizar a sociedade em geral, de modo preventivo e planejado, para não agirmos apenas quando a situação estiver muito crítica e, eventualmente, irremediável. Como nenhum ser vive sem água - e muito menos os seres humanos, é indispensável que seja valorizado esse patrimônio que é a água. Sem a participação social em torno de discussões como planos de saneamento (água, esgoto, resíduos sólidos e drenagem pluvial), de ordenamento territorial, de saúde, educação, enfim, sobre a cidadania e a democracia, nosso futuro no planeta estará em risco.
João Batista: Devido à ausência do Plano de Bacias, as discussões pouco impactam, pois o comitê fica, neste caso, somente como "órgão" consultivo, ao invés de deliberativo.
O Projeto Consonâncias parabeniza os professores Marcos Bernardes e João Batista pela importante atuação e agradece pela participação.
Texto e informações por Luana Rego Campinho e Lilian Reichert Coelho
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